

ILHA DE SÃO JOSÉ - TO
O Banco de Imagem sobre a Ilha de São José – Tocantins busca algo especial. Não só ir além da escrita, mas também ir além do meio cinematográfico, dos especialistas e dos meios de comunicação de massa. O registro fílmico assegura o não desaparecimento do patrimônio cultural de uma sociedade, grupo social e indivíduo. Histórias de vida, testemunhos individuais ou coletivos, modos de vida, mitos, crenças, danças, saberes, técnicas rústicas, a geografia, sentimentos dos habitantes da Ilha de São José e dos lugares vizinhos podem quantas vezes necessário serem vistos e revistos.
Azeite de coco de babaçu
Num trabalho artesanal, a amêndoa de babaçu é transformada em óleo, que também é chamado de azeite. Especialmente no verão, tempo da seca, é comum sentir o perfume do azeite de babaçu exalado no ar, vindo de longe, de alguma casa onde alguém está tirando o óleo comestível de inconfundível qualidade e sabor.
O azeite de babaçu é extraído de amêndoas maduras que ficam dentro dos cocos das palmeiras. Os cocos maduros caem dos cachos no chão ao redor das palmeiras de babaçu. E os cocos são catados seletivamente para obtenção de amêndoas novas, boas para a produção do óleo.
Fumo de rolo
Atualmente, a única pessoa que ainda trabalha com fumo é Maria Eunice. Ela que plantou o fumo na sua terra. “Plantei já no mês de maio, lá pro fim de maio, terra tava meio seca, sei nem se vai prestar. Porque o fumo, tempo de plantar ele é abril. E em abril tava chovendo demais, e ali naquele baixão tava tudo cheio de água, num podia plantar”, diz Maria Eunice. O fumo demora aproximadamente três meses para ficar bom para ser colhido, e a folha fica bem encaroçadinha, amarela, “aí tá maduro”.
Pra fazer a corda “vai emendando as foia tudinho ali, enrolando, enrolando, isso é muito mói de fumo que ocê faz, e vai fazendo igual uma corda. Não é assim muito fácil não, não é todo mundo que sabe fazer não”, diz Maria Eunice.
Colheita de arroz
O arroz se adapta bem às áreas que ficam inundadas na época da cheia. A maior vantagem de plantar em área alagada é que o arroz não “chocha”. Segundo Valdeci, “chochar é ele dar o cacho branco, ele só paia. Só dá essa paínha branca aqui, ó. Aí você não aproveita nada dele não.
A colheita começa em março e vai até maio, e a cor do arroz é o principal indicador de que ele está pronto para ser colhido. “Quando está na época de colher, ele amadurece e a gente caça um jeito de colher. O arroz ele é vermelho quando está maduro. Por acaso ele nasce verdinho assim, aí ele vai mudando a cor, depois ele já fica todo vermelhinho...”
Sr. Lázaro - construtor naval
Lázaro Soares da Silva (nasceu num lugar chamado Solta, em Carolina, no dia 20/09/1946, mas nos documentos consta 20/11/1946, é filho da parteira Rosa Bieca) é casado com Simone Dias do Nascimento (filha de Abidoral e Petronilia, nasceu em 27/05/1987, na Ilha, e sua avó Francisca foi a parteira).
Ele é artesão, construtor naval. Lazaro tem 30 anos de profissão e vem lutando e ficando na ilha. Morou encostado na Ressaca, trabalhou muito para o Zeca Amorim. Cria a família com 4 alqueires de terra. Pai e filho limpam, não precisa de trator. Ele teve 9 filhos do primeiro casamento, só o José Alfredo Pereira da Silva, conhecido por Zé Alfredo, mora na Ilha, os outros moram no Estreito.
A Ilha de São José
O Rio Tocantins é o maior rio totalmente brasileiro com extensão de cerca de 2.400 km. Ele nasce no Planalto de Goiás, com o nome de Padre Souza, passando logo após a se chamar Rio das Almas. Recebe o nome de Rio Tocantins a partir da junção dos rios Paranã e Maranhão e sua foz é na Baía de Marajó (PA), onde também deságuam os rios Pará, Acará e Guamá em direção ao Oceano Atlântico. O longo Rio Tocantins corre por entre planícies e planaltos, atravessa as chapadas, corredeiras, cachoeiras, pedregais, montanhas, povoados, cidades, serras, matas, casas ribeirinhas e aqui e acolá uma cidade cresce. Sua imensidão de água corrente interliga um extremo ao outro do Brasil, do interior ao litoral, banha o chão de fartura, terra de promissão, provê, alimenta e inspira. Oferece praias, pesca, banho e navegação.
Pelo caminho do Rio Tocantins há muitas ilhas espalhadas, pouco ou muito habitadas, algumas pequenas outras relativamente extensas. Do Porto de Babaçulândia (TO), ou “Coco”, como ainda hoje alguns chamam este núcleo urbano, barcos de linha descem o rio transportando passageiros. Depois de aproximadamente uma hora de viagem de barco, o rio é bipartido pela fértil Ilha de São José, com 12 km de extensão da ponta de cima até a ponta de baixo e 6 km de largura na parte central, sendo afinada nas duas pontas. Essas medidas variam conforme o volume de água no rio. Como o rio se divide em dois braços, chamam os dois lados da ilha – as beiradas da ilha – de braço direito, com vista para as serras e morros na margem do Maranhão e o braço esquerdo a beira que fica de frente para a margem do Tocantins.
Da ponta de cima até a ponta de baixo da Ilha de São José, avista-se os portos e as casas de palha da palmeira babaçu, taipa e adobe, as matas ciliares e as vazantes com roças de arroz, milho, feijão que mostram a labuta diária e a farta produção. Os babaçuais são paisagem constante, e o extrativismo vegetal é feito para complementar o sustento. São mais de 90 famílias que têm o Rio Tocantins como sustentáculo para viverem, criarem seus filhos, reproduzirem sua cultura cheia de tocantinidade, onde a miscigenação se faz presente.
A Ilha de São José é um lugar favorecido pela natureza, cuja fertilidade não tem igual. “Tudo que se planta se colhe”, dizem seus moradores. É boa a fruticultura: laranja, caju, abacate, melancia, acerola, maracujá, manga, murici, graviola, pequi, limão, bananas... Nas hortas tem tomate, cebola, cebolinha, quiabo, jiló, diversos tipos de pimenta... Em seus quintais, pequenas criações de porco, gado, galinha, pato... “A terra aqui da ilha eu acho muito boa porque aqui tudo o que a gente planta, produz e é bom. Bom mesmo. Tem banana, arroz, feijão, todo tipo de coisa que a gente planta dá bom. Terra forte. Bom para criar gado, criar tudo aqui. Aqui tudo é com mais força. O rio está aqui de um lado e do outro”, diz a moradora Rosedina.
É no Rio Tocantins que o povoado da Ilha de São José se banha, as mulheres lavam as roupas, as crianças brincam e tibungam na água. Canoas e barcos ficam amarrados nos portos. Tem vazanteiro, criador, parteira e o pescador. Gostam de dormir em rede. A luz é de lampião, lamparina e lanterna. Poucos moradores têm motor que gera energia, geladeira e televisão. A água para beber é a do rio. “Só a água do rio que mata a minha sede”, dizem moradores da ilha. Utensílios de trabalho e do lar, a cozinha típica, sabores, valores, mitos, usos e costumes, superstições e crendices mostram a íntima relação dessa gente com a natureza que os abriga.
CINEMA ANTROPOLÓGICO E DOCUMENTÁRIO